Preconceito e falta de patrocínios atrapalham a popularização do speedrun no Brasil

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Bastante popular nos Estados Unidos, o speedrun ainda é largamente desconhecido no Brasil, até mesmo por aqueles que possuem familiaridade com videogames e acompanham as principais novidades da indústria. Speedrun trata-se do terminar jogos o mais rápido possível, aproveitando-se de erros de programação dos títulos ou por meio de habilidade própria. Para ambos os métodos há classificações específicas, as quais possuem ainda subcategorias determinadas. No entanto, a falta de ciência acerca do tema gera um grande obstáculo para a popularização da prática em território nacional: o preconceito.

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Porém, de acordo com Hugo Carvalho, integrante da organização da Brazilians Against Time, maratona beneficente que reúne diversos runners — como são chamados os jogadores que fazem speedruns —  em prol de arrecadar doações para ONGs, há otimismo quanto ao crescimento da prática no Brasil.

“Ainda é pequeno por estar muito espalhado, mas está em forte expansão. Temos muitos talentos espalhados, mas que estão isolados. Praticamente todos os dias encontramos novos speedrunners brasileiros que não conhecem outros como eles e acreditam estar sozinhos no país”, disse o organizador em entrevista ao Combo Infinito. “Existe uma comunidade unida, a Speedruns Brasil, e aos poucos estes jogadores estão se encontrando nela e isso está permitindo a eles fazer coisas cada vez maiores.”

É o mesmo que diz Matheus “FURiOUS ” Furtado, conhecido por ser detentor do recorde mundial de tempo de finalização de Super Mario World (seu tempo foi de 1 minuto, 13 segundos e 32 milésimos). Segundo ele o cenário tem crescido bastante e “acredito que cada vez isso tende a se expandir mais e mais”.

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Você pode ver o vídeo de FURiOUS finalizando Super Mario World em tempo recorde logo abaixo:

 

O grande obstáculo

Contudo, há ainda um longo e desafiante caminho a ser trilhado até que a modalidade chegue ao grande público de jogos. Para Hugo, “dois pontos são extremamente importantes: desmistificar o que é uma speedrun, e ter mais eventos”. Segundo ele, é preciso mostrar que as speedruns são justas e têm regras específicas a serem seguidas.

“Muitos gamers brasileiros adoram jogar, adoram platinar seus jogos, mas estranham speedruns”, explica. “O speedrunner apenas encontrou mais uma maneira de jogar seu jogo favorito, ao tentar terminar de maneiras mais inesperadas. O segundo ponto é fazer os melhores eventos possíveis de speedrun. Estamos trabalhando nisso.”

Já para FURiOUS, a exposição sobre speedruns feita pela mídia possui grande relevância para que se atinja o público maior de videogames. “Raramente se via noticias sobre speedrun no Brasil, somente agora que isso está tendo mais atenção, essa divulgação é bem importante para que mais pessoas entendam essa ‘modalidade’ de jogar.”

Quando questionados sobre o que impede a popularização da prática em solo brasileiro, ambos foram unânimes em suas respostas: preconceito. De acordo com Hugo, muitos presumem que ao usar erros de programação em jogos para terminá-los mais rapidamente está se “roubando”. “Embora pareça um momento de sorte ou uma trapaça, esses glitches e bugs são muito precisos e muitas vezes exigem quantidades extremas de treino para serem executadas com consistência.”

“Estamos falando repetir centenas ou milhares de vezes o mesmo movimento no jogo para conseguir executar com precisão”, destaca o organizador. “O que falta é a compreensão de que você pode competir numa speedrun da maneira que achar melhor, e sim, ter uma competição justa.”

Ainda, ele comenta que a apreciação de speedruns por parte dos brasileiros ocorrerá apenas quando estes compreenderem as categorias da prática e que podem jogar da maneira com a qual mais lhe traz conforto. “Acredito que assim que o brasileiro compreender o que são categorias e souber que ele pode jogar da maneira que ele se sente confortável e ter competições com regras honestas, ele irá gostar muito mais das speedruns.”

O que Hugo disse acerca da repetição constante pode ser exemplificado por meio do vídeo da speedrun de FURiOUS acima. Ativar todos os glitches necessários — os quais ele explica detalhadamente em sua gravação — para terminar o jogo da forma mais veloz possível é um grande desafio. É possível vê-lo andando para lá e para cá com o Mario, pegando alguns cascos vermelhos e fazendo o Yoshi cuspir algumas bolas de fogo. Embora pareça apenas enrolação a priori, cada movimento feito com o personagem é consciente e extremamente específico, levando em conta até mesmo, em certo momento, quantos pixels há na tela.

Além disso, é preciso ainda que um segundo controle esteja conectado ao Super Nintendo que roda o jogo, sendo necessário que os botões L + direita + baixo + select + Y + B estejam pressionados simultaneamente. Mas, para isso, FURiOUS utiliza pedaços de papel e ligas, demonstrando o poder do “jeitinho brasileiro”.

Ausência de eventos no Brasil: por quê?

Devido à baixa popularidade no País, eventos brasileiros de speedruns são quase inexistentes. Além da Brazilians Against Time, há maratonas mais modestas como, por exemplo, a realizada pela comunidade Speedruns Brasil, que também como objetivo arrecadar fundos para ONGs. Ainda, na edição de 2016 da Brasil Game Show houve uma maratona organizada pela AACD, em parceria com o Jogatona, grupo que realiza maratonas beneficentes, a fim de arrecadar fundos para a associação de assistência a crianças deficientes. Apesar de possuirmos alguns exemplos, dá para contá-los nos dedos de uma mão só.

Segundo Hugo, o principal impasse quanto a realização de eventos de porte similar ao da Awesome Games Done Quick (AGDQ), uma das maiores maratonas de speedruns do mundo (que em sua última edição arrecadou mais de 2 milhões de dólares para a caridade), é a falta de patrocinadores. “Temos sempre gente aprendendo conteúdo novo para apresentar, temos muita gente com boa vontade de ajudar a realizar eventos, temos instituições dispostas a participar e receber os recursos beneficentes, mas sempre falta dinheiro para realizar um evento melhor”, explica o organizador.

De acordo com ele, a próxima edição da Brazilians Against Time ocorrerá em um espaço cedido gratuitamente à organização da maratona, o que, segundo Hugo, “é algo extremamente raro“. Ele ainda explica que a dimensão territorial do Brasil é também um dos grandes problemas, tendo sido uma tarefa difícil trazer speedruns de regiões longínquas, como Ceará e Rio Grande do Norte.

“Tivemos ajuda da Twitch desta vez para trazer os mais distantes”, diz o organizador. “Mas tivemos de fazer um esforço tremendo para conseguir trazer todos os outros.”

Já para FURiOUS, o maior desafio para a realização de eventos com uma estrutura maior é também a falta de patrocínios, a qual deriva da idade da prática no Brasil. “Não sou especialista nessa questão, mas creio que por ser algo novo, geralmente é difícil encontrar patrocínio/apoio pra promover um evento maior. Isso acaba ficando as custas dos organizadores“, comenta.

Apesar da falta de eventos, o Brasil conta com muitos brasileiros detentores de recordes mundiais em tempo de finalização de jogos. Neste ano, Jennifer Sarah, mais conhecida como Roxy_Rose, entrou para o Livro dos Recordes ao terminar Life is Strange em 5 horas, 31 minutos e 53 segundos.

 

O fascínio pelo terminar jogos rapidamente

Para muitos, é uma incógnita o motivo pelo qual pessoas são fascinadas em finalizar jogos o mais rápido possível. Geralmente, alguns que gostam muito de um título tentam o finalizar de inúmeras maneiras, incluindo também o seu término em tempo record próprio, fazendo, de maneira inconsciente uma speedrun. E de acordo com Hugo, o fascínio decorre, também, dessa mesma apreciação. “Acredito que seja porquê é muito bom conhecer tudo sobre os jogos que gostamos, e porquê gostamos de sermos capazes de fazer coisas bem feitas. Gostamos de assistir alguém jogando algo muito bem e isso desperta a vontade de fazer o mesmo.”

Segundo o organizador, é como assistir a uma partida de futebol e o desejo de se pôr em prática no esporte desperte. Além disso, ele explica que ver uma speedrun permite que vejamos uma nova visão do jogo que não tínhamos anteriormente. “Fazer uma boa speedrun dá uma sensação de auto-realização, de que só platinar não basta, de que existe muito mais a se fazer e se provar como um dos melhores do país e do mundo naquele jogo”, comenta.

FURiOUS diz que “acho que o desafio em si é algo interessante”. O runner comenta ainda que “só voltei a jogar Super Mario World pois eu queria saber até onde minhas habilidades no jogo poderiam me levar”, as quais, como prova o Livro dos Recordes, são muito boas.

Quando pedi para que Hugo oferecesse dicas e sugestões para aqueles que desejam fazer speedruns, a sua resposta coincide novamente com o apreço que se sente pelos jogos com os quais deseja-se realizar as runs. “O maior segredo (e que ninguém acredita) é escolher um jogo que você goste muito MESMO. Pra ser bom em uma speedrun você vai jogar centenas ou milhares de vezes o mesmo jogo, então gostar dele é fundamental.”

Segundo ele, é importante buscar sobre TAS (tool-assisted speedrun), ferramente utilizada em speedruns que oferece diversos recursos tais como a exibição de frame por frame, rodar um jogo em uma velocidade mais lenta, exibição de erros de programação, entre outras ferramentas. O organizador diz ainda que é de muita relevância estar sempre atualizado dos recordes atuais, que se encontram em sites como o Speedrun.com.

Para o recordista mundial, a “primeira coisa que você precisa é ter um jogo que você ame muito, speedrun exige que você pratique exaustivamente estratégias/rotas/tricks pra conseguir um tempo recorde pessoal razoável”.

“Não pense em querer o primeiro lugar no ranking, pense em ir melhorando seu tempo apenas. A prática leva a perfeição, e não existe nada mais gratificante ao terminar uma run e dizer, EU CONSEGUI!”, diz FURiOUS. Ele ainda sugere que aqueles que estiverem interessados no meio devem buscar a Speedrun Brasil, comunidade brasileira de speedrun.

 

Brazilians Against Time 2017

A edição deste ano da Brazilians Against Time ocorrerá entre os dias 1° e 4 de junho, na Walkers Magic Store, em Guarulhos, no estado de São Paulo. Porém, não será um evento aberto ao público. De acordo com Hugo, somente a imprensa, voluntários, runners e a própria organização poderão ir à maratona presencialmente. Isso acontece porque “não tivemos recursos para o oferecer o mínimo igual ao ano passado, então tivemos de poupar para garantir o evento”.

Apesar disso, a nova edição será maior comparada a anterior. O organizar pontua que “aumentamos em um dia a maratona, e trouxemos 50% mais speedrunners que a edição anterior, e conseguimos trazer mais pessoas de outros estados mesmo com as dificuldades”.

Em 2016, a Brazilians Against Time contabilizou um total de mais de seis mil e quinhentos reais em doações para a AACD, um valor modesto quando posto em comparação ao recorde da AGDQ 2017, mas muito significante para a instituição e para o cenário de speedrun. De acordo com Hugo, o principal objetivo da nova edição é conseguir ultrapassar a meta do ano anterior, sendo os novos investimentos um dos motivos de otimismo para alcançar a meta.

Aqueles que não participarão da nova edição do evento, que contará com a presença de jogos como Final Fantasy VII, Undertale e Mega Man X, vão poder acompanhar toda a maratona através do canal oficial da Brazilian Against Time do Twitch. Você pode conferir todo o calendário do evento clicando aqui.

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